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mobilidade ativa pedonal

Mobilidade ativa pedonal

Sabia que Portugal tem uma Estratégia Nacional para a Mobilidade Ativa Pedonal para o Horizonte 2030 (ENMAP 2030)? Muito resumidamente, neste artigo vamos conhecer o que a ENMAP nos diz, o que propõe, e uma sintética referência aos fatores críticos de sucesso.

Provavelmente o leitor desconhece que Portugal tem uma Estratégia Nacional para a Mobilidade Ativa Pedonal1 para o Horizonte 2030 (ENMAP 2030). É natural! É um tema pouco mediático, mexe com o nosso comportamento, e a predisposição dos cidadãos para mudar o paradigma do uso intensivo do veículo automóvel, nomeadamente nas grandes áreas urbanas e suburbanas é nula ou quase nula. Sentimo-nos confortados e são poucos os que abdicam deste conforto!

Muito resumidamente, vamos conhecer o que a ENMAP nos diz, o que propõe, e uma sintética referência aos fatores críticos de sucesso.

Como estamos a nível nacional

Apesar das mais variadas iniciativas desenvolvidas em matéria de promoção da mobilidade ativa, a Figura1 revela uma evidente perda de competitividade do modo pedonal ao longo dos últimos 20 anos. O aumento da quota de utilizadores do transporte individual evidencia a necessidade de uma transformação no paradigma de mobilidade em Portugal. Estes dados colocam o modo pedonal numa posição periférica no contexto global de mobilidade2.

Evolução da distribuição modal em Portugal entre 2001 e 2021
Figura 1 – Evolução da distribuição modal em Portugal entre 2001 e 2021
[Fonte: INE, Censos 2001, 2011 e 2021].

Como mudar o atual paradigma da mobilidade

Não é fácil! A mudança gradual e sustentada do atual estado da mobilidade em Portugal para a mobilidade pedonal é um ato e uma responsabilidade de todos os cidadãos. Vamos agora conhecer as metas que a ENMAP propõe e os respetivos fatores críticos de sucesso.

Metas ENMAP 20303

Alterar padrões de mobilidade32021: deslocações pendulares pedonais (ano de referência INE): 16%.
Alterar padrões de mobilidade2026: aumentar a quota modal das deslocações pedonais para 25%.
Alterar padrões de mobilidade2030: aumentar a quota modal das deslocações pedonais para 35%.
Transformar o espaço pedonal acessível a todos2023-2024: definir uma metodologia para a realização do levantamento das condições de acessibilidade universal em todas as centralidades urbanas do país e verificação da percentagem de espaço público passível de utilização por todos.
Transformar o espaço pedonal acessível a todos2026: Incremento de 30% da percentagem de espaço público passível de utilização por todos.
Transformar o espaço pedonal acessível a todos2030: Incremento de 50% da percentagem de espaço público passível de utilização por todos.
Promover estilos de vida ativos e saudáveis — diminuir o sedentarismo2020 [ano de referência da Direção-Geral da Saúde (DGS)]: 46,4%; (percentagem de cidadãos que afirmou passar mais de 7 horas por dia de tempo sentado, de acordo com o relatório do Programa Nacional para a Promoção da Atividade Física Portugal 2021).
Promover estilos de vida ativos e saudáveis — diminuir o sedentarismo2026: diminuição em 10%.
Promover estilos de vida ativos e saudáveis — diminuir o sedentarismo2030: diminuição em 15%.

Fatores críticos de sucesso

Os fatores críticos de sucesso (Figura 2) são pontos-chave fundamentais para garantir o êxito da ENMAP 2030 e que podem alavancar ou condicionar a sua implementação e cumprir as respetivas metas. Impõe se uma articulação intersetorial das políticas públicas associadas à mobilidade pedonal bem como a sua articulação com os demais modos de transporte.

Fatores críticos de sucesso
Figura 2 – Fatores críticos de sucesso [Fonte: ENMAP].

Vejamos muito resumidamente do que consta cada um dos fatores acima indicados:

Da educaçãoNa promoção de novos comportamentos e de compreensão dos benefícios da mobilidade ativa e saudável
Só uma escola ativa poderá fornecer o conhecimento de que é possível e desejável andar a pé. O trabalho que, iniciado nas escolas, será levado ao seio familiar deverá produzir alterações consideráveis nos hábitos culturais instalados. O sistema escolar apresenta-se como essencial para a alteração comportamental que, começando no seu próprio interior, daí emanará para a comunidade em que se insere. Para isso, deverá o corpo docente possuir novas competências nesta matéria e munir-se de projetos educativos capazes de estimularem novas formas de mobilidade e em particular andar a pé.
Da culturaE da urgência na alteração de comportamentos
As alterações culturais são porventura as mais difíceis de concretizar, mas também as mais estruturantes e eficazes. A promoção do modo pedonal tem nas autarquias locais o principal agente impulsionador por se constituírem como o gestor da infraestrutura pedonal. As campanhas publicitárias para aquisição de automóvel, conferindo-lhe um valor simbólico de juventude, autonomia, beleza e estatuto social, em todos os meios comunicacionais, apelam fortemente à sua constante utilização; só contrapondo através de campanhas criativas e persistentes sobre o valor e a importância de andar a pé se poderá alcançar um equilíbrio nesta presença quotidiana.
Do planeamentoE da relação da mobilidade com o uso do solo
A UE privilegia a existência de planos de mobilidade urbana sustentável como figuras de planeamento adequadas para a promoção da mobilidade ativa e a sua integração e articulação com os demais modos de transporte. A relação entre a mobilidade e o uso do solo é incontornável, pelo que deverão estas figuras de planeamento, à escala adequada, propiciar uma melhor integração destes fatores essenciais para a qualidade de vida dos cidadãos, tendo em consideração 6 D essenciais: densidade, diversidade, design, destino, distância e demografia. O projeto de espaço público é um ponto-chave para que andar a pé se possa realizar de forma segura, confortável, atrativa e universal.
Da infraestruturaE da sua utilização em segurança
Para a segurança de andar a pé importa a existência de uma infraestrutura contínua, direta e segura. O planeamento da rede pedonal requer uma visão de conjunto, global e integrada do sistema de transportes e das relações que se estabelecem entre as deslocações a pé, a ocupação e a envolvente urbana. A infraestrutura deve atender, nomeadamente, à conetividade e adequabilidade; acessibilidade universal; segurança rodoviária; segurança pessoal; legibilidade; conforto; atratividade e convivialidade.
Num momento em que ocorre o aumento do número de veículos elétricos em circulação, cuja emissão de ruído é significativamente mais baixa, importa acautelar as condições adequadas à população com deficiência auditiva.
Da fiscalidade e
incentivos
No financiamento da mobilidade pedonal
Estimular a mobilidade ativa através da fiscalidade, de incentivos e/ou recompensas dirigidos a cidadãos e empresas é um caminho que tem sido experimentado em alguns países.
Promover a transferência de receitas provenientes dos impostos associados à aquisição e circulação de veículos automóveis para a criação de apoios à promoção da mobilidade ativa é uma forma de incentivar alterações comportamentais individuais e coletivas, tais como o aumento da atividade física, a redução do sedentarismo, a promoção da saúde pública, a descarbonização da economia e a redução da pegada ecológica.
Outros aspetos a considerar são as medidas, fiscais ou outras, dissuasoras da ocupação de lugares de estacionamento na via pública. O maior entrave à melhoria da infraestrutura pedonal é a pressão do estacionamento, pelo que importa definir uma política fiscal que contribua para a redução da oferta de estacionamento na via pública, designadamente a 2.ª e 3.ª motorização.

São várias as razões pelas quais a mobilidade pedonal deve ser incentivada. A promoção do ato de andar a pé, enquanto forma de deslocação natural e universal, contribui para a prossecução de objetivos coletivos benéficos para a sociedade como um todo, nomeadamente por: promover a cidadania, melhorar a qualidade de vida, contribuir para a melhoria do ambiente e descarbonização da economia, fazer bem à saúde.

Vamos andar a pé?

Nota: o presente artigo não é nem um sumário nem um resumo da Estratégia Nacional para a Mobilidade Ativa Pedonal 2030. Pela sua natureza e pela sua pertinência, aconselhamos vivamente o leitor a ler o diploma na íntegra, pois será surpreendido com a informação que nele consta.


  1. Resolução do Conselho de Ministros n. º 67/2023, de 7 de julho. ↩︎
  2. O ENMAP refere que os dados apresentados advêm dos Censos, realizados de 10 em 10 anos pelo INE, onde se questiona sobre o principal modo de transporte, e apenas para quem trabalha ou estuda, e faz deslocações diárias entre o local de residência e os locais de trabalho ou estudo. Não são considerados os percursos efetuados a pé antes ou depois da principal etapa da deslocação, realizada em veículos motorizados. ↩︎
  3. Para esta meta, assumiu-se como valor de referência o valor relativo às deslocações pendulares pedonais determinado pelo INE, com base nos Censos 2021 (deslocações diárias entre o local de residência e os locais de trabalho ou estudo) por ser a melhor informação disponível atualmente. Admite-se que no decorrer da implementação da ENMAP possa ser definido, para esta meta, um indicador que melhor espelhe a evolução das deslocações em modo pedonal. ↩︎

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