renováveis magazine

o cumprimento da promessa solar

O cumprimento da promessa solar

Portugal (juntamente com Espanha) tem o maior recurso solar da Europa, com uma média anual de cerca de 1600 a 2200 kWh/m2de radiação global (GHI). Além disso, o nosso país apresenta uma visão estratégica de desenvolvido para solar fotovoltaico bastante ambiciosa, refletida no Plano Nacional de Energia e Clima para 2030 (PNEC 2030), o que torna o país um dos mercados mais promissores para o desenvolvimento da tecnologia. Esta realidade coloca o holofote na evolução do mercado, e impõe uma visão estratégica também sobre as principais barreiras que ainda persistem.

Desde 2020, a capacidade instalada praticamente quintuplicou, de 1076 MW para 5005 MW. Destes, 2737 MW são utility-scale, 1875 MW para autoconsumo, 213 são UPP’s, 164MW de micro/mini produção, e 15 MW de concentração. Ainda não atingimos o final do ano, e Portugal já instalou 1,1 GW (até ao fim de setembro), quando em 2023 tinha instalado 1.2 GW, ano record para o país em termos de capacidade a entrar em operação.

Com base no que já foi instalado este ano, é expectável que seja atingido um valor máximo de capacidade instalada num ano de qualquer tecnologia de fonte renovável. Em 2023, a geração solar representou 8,2% do total de eletricidade gerada em Portugal Continental. Em 2024 (até novembro), este valor situa-se nos 11,4%, e prevê-se que este crescimento venha a aumentar significativamente nos próximos anos.

Esta evolução representa, não só a ambição do governo português para a transição energética nacional, mas também (e mais importante) a ação. A restruturação da legislação do setor, em 2022, veio reestabelecer e organizar o funcionamento do Sistema Elétrico nacional, acoplando as diferentes peças de legislação existente, de forma atualizada, e mais esclarecedora. A simplificação de alguns processos de licenciamento nos últimos anos veio acelerar estes complexos processos, existindo, contudo, ainda pontos melhorar e que precisam de ser reorganizados.

A nível da capacidade descentralizada, tem-se visto um crescimento das comunidades de energia, proveniente de uma maior consciencialização para as vantagens do solar fotovoltaico, do incentivo à sua instalação, e da redução do preço da tecnologia. Estas comunidades de energia englobam, muitas vezes, um produtor com picos de consumo relativamente curtos, associados a um consumo médio reduzido (estádios de futebol, edifícios municipais, etc), e acabam por envolver as comunidades locais nos projetos, aumentando assim a participação pública na transição energética e também a literacia energética.

Apesar de todo o desenvolvimento do setor conseguido até à data, ainda será necessário fazer muito para atingir as metas ambiciosas estabelecidas. Em 2024, o Governo português aumentou as metas para a evolução da capacidade renovável instalada até 2030, no PNEC 2030, com a tecnologia solar fotovoltaica a representar a maior evolução – 20,8 GW instalados até 2030.

Dos 20,8 GW, 15,1GW serão centralizados, e 6,7 GW descentralizados. Parte desta capacidade será instalada para o fornecimento de eletricidade a 3GW de eletrolisadores para a produção de hidrogénio verde (em conjunto com capacidade eólica onshore e offshore).

No PNEC 2030, o Governo português salienta ainda o incentivo a que sejam realizados contratos de longo termo – PPAs e CfDs – para o fornecimento de eletricidade a partir das centrais fotovoltaicas, de forma a prevenir os consumidores e os produtores de oscilações nos preços da eletricidade, como também de aumentar a resiliência do sistema elétrico.

Associado a esta medida está também previsto o desenvolvimento do armazenamento, através de baterias (para além do hidrogénio verde já referido), para conseguir responder ao consumo fora das horas de maior produção solar. Já foi inclusive anunciado o primeiro leilão de armazenamento, para 500 MW de baterias, para o qual o Governo irá disponibilizar aproximadamente 100 M€ em apoios aos projetos.

O cumprimento destas metas está, no entanto, dependente da resolução de desafios que já existem, ou que se prevê que possam vir a existir nos próximos anos. Atualmente, Portugal enfrenta desafios no desenvolvimento da capacidade de receção da rede elétrica, o que limita o desenvolvimento de projetos fotovoltaicos de grande escala, que dificilmente serão para consumo local.

Adicionalmente, este ano houve um recorde de horas de fecho do mercado SPOT ibérico de eletricidade (MIBEL) com um valor negativo, fruto da canibalização da oferta existente, devido à já elevada incorporação de renovável no mercado ibérico, sem um desenvolvimento adequado ou com maturidade dos serviços auxiliares e de flexibilidade.

Este efeito será mais recorrente no futuro, considerando o aumento da capacidade instalada esperado em ambos os países. Para tal não acontecer é necessário que 1) seja feito um investimento em sistemas de armazenamento, e 2) sejam criadas as condições necessárias para os contratos de longo prazo.

O solar fotovoltaico em Portugal tem um grande potencial de crescimento, e as ações do Governo, em conjunto com o interesse dos membros do setor, anteveem uma evolução positiva, rumo às ambiciosas metas estabelecidas.

Ricardo Ferreira
APREN – Associação Portuguesa de Energias Renováveis

Outros artigos relacionados